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quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

São únicas no mundo

Aquela bonita mulher de lábios finos, sempre com o tom vermelho, foi sem dúvida das pessoas mais importantes para mim.
Possuidora de um humor único, um amor inabalável e uma força da natureza.
Esta mulher era a minha avó paterna e o que vou escrever, tentando pôr aqui um pouco de humor, é para ela se rir a bom rir, onde quer que esteja.

No bairro de Alvalade, onde viveu quase toda a sua vida, era sempre a Senhora Dona Emília. Parece que a estou a ver na Biarritz (não em França, era mesmo a pastelaria no inicio da Avenida da Igreja).  "Bom dia Senhora Dona Emília, é a meia torrada com galão escuro?" Sim, era senhora que tomava o pequeno almoço fora todos os dias e ali ficava com as amigas à conversa antes de ir à praça.
A romaria da tarde ficava-se pela Helsínquia (outra pastelaria ok, sim, em Alvalade sempre foram chiques nas escolhas dos nomes dos cafés, chorem cascalenses). Aqui o repasto era sempre um jesuíta e um café e as conversas incluíam muitas vezes o actor  Curado Ribeiro, e nós ? Bem, nós brincávamos cá fora ás corridas (sim eu brinquei na rua, nasci em 1973), o Bairro onde nasci e cresci era seguro.
Não havia vez nenhuma que eu saísse de casa da minha avó que não tivesse um docinho, uma bolacha, um chocolate, havia sempre algo que saía da manga mágica.
Parece que ainda ouço "Kiki, o que queres para o lanche?", "Panquecasss vó" e como eu me ria e deliciava a ver a forma magistral como aquelas panquecas se viravam no ar (no fundo havia aquele pavor de que um dia a panqueca vem ao chão, nunca aconteceu).
Quando  não queríamos dormir dizia "Olháaa Bruxa lá no castelo de Leiria" ahahah, ríamos todos e acabávamos por adormecer.  Noutra altura acordou-me na noite da passagem de ano para ir bater os tachos, contrariando o meu pai (sim tachos, ide pesquisar no google como eram as passagens de ano pós 1975, antes de me aborrecerem com questões). 
Não havia férias de verão sem a nossa Milocas, como carinhosamente a chamávamos.
A malta reunir-se em matilha (sim, os Britos são como uma matilha) em S. Pedro de Moel, bem era era a loucura total, no fundo acho que aquela mulher rogava-nos pela pele a todos...tanto neto junto é coisa para enlouquecer, mas nunca a nossa sargento.
Havia os slogans tão avó, porra o tão típico "prá praia que o sol já raia" ás 8.30 da manhã, como sol às 8.30 da manhã?? Como levantar cedo em plenas férias e ainda por cima em Agosto?? A avó só podia estar doida. Sol, qual sol? Só mesmo na cabeça daquela senhora (todos sabem o tempo que faz no oeste, nem era S. Pedro sem aquele nevoeiro matinal).
Lá vinha ela sempre com os cães atrás para nos arrancar da cama, e quando digo arrancar é literalmente tirar as cobertas para trás e rematava com "vá rápido, que as torradas já saltam da torradeira", chantagem emocional pura, ninguém resiste aquelas lambidelas da Spi pela manhã, ou aos olhos do  Swing a espreitar.
Bem, na verdade, é que a custo lá enfiava o biquini e rumava à praia, onde dormia até á uma da tarde, sorry Milocas, sempre cultivei muito o descanso matinal.
Na realidade chegámos a ser mais de 3,entre o Miguel, Ricky, a Isa, Clara, Babá, Carlos, Nice, Joana, o Manel e eu, a preferida, que podia fazer mais asneiras que os outros, os meus primos NUNCA aceitaram muito bem,  azarrrr nasci para arrasar criaturas.
Todos, sem excepção, adoramos aquela mulher,  todos sabíamos que ela, a matriarca, era um poço de amor, (vá, não vale a pena chorar porque ela também ralhava).
Era uma cozinheira maravilhosa, aquele bolo de suspiros era algo divinal, a sopa de feijão, as favas aii jazusss, agora babei, nunca mais comi algo igual, era um ritual aqueles almoços em família.
Quando fez 90 anos reunimos-nos todos numa festa única, filhos, netos, bisnetos, amigos, um mundo de Britos reunidos numa bonita festa a uma das pessoas mais maravilhosas de sempre, mal sabíamos nós que ela nos dia deixar um mês depois, envolta num num sorriso e sempre com a piada pronta "estes gajos não me querem de unhas pintadas, espera lá que eu já vos dou a volta, verniz transparente e nem piam", dizia ela a sorrir.

Lidar com a perda é algo que nós como humanos não estamos habituados, lidar com a perda de alguém que muito amamos, definitivamente não fazia parte dos meus planos.
Todos os dia penso nesta mulher que foi tão importante para mim, aliás foi importante para todos nós. Como nos dizia sempre "tristezas não pagam dividas" e não pagam mesmo, sorrir é a forma mais honesta de te homenagear.
Mas confesso que ás vezes a tristeza de não te poder ligar, como fazia tantas vezes se apodera de mim, não te zangues Maria Emília, uma pessoa tenta mas não é de ferro.

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