Isto de estar em isolamento social, em plena época de quaresma, está a tornar-se uma tarefa inglória, uma verdadeira luta de titãs, em que neste momento a renúncia quaresmal está a levar uma verdadeira coça e não vejo forma de isto abrandar.
Ora os ensinamentos dizem que que existem 7 pecados, aos quais nunca, jamais em tempo algum te deves aproximar :
Soberba ❌
Luxuria❌
Ira❌
Inveja❌
Preguiça❌
Avareza❌
Gula✅✅✅✅
Aqui confesso eu a Deus todo poderoso e a vós irmãos que eu pequei e por minha culpa, minha tão grande culpa... que usei e abusei do avental e toca de enfiar as mãos na massa...
Olhando a realidade de um confinamento forçado, o que temos nós? hum? Trabalho e um big brother diário. Ora, esmiuçando bem a situação em tempos ditos antigos e remotos, vulgo há um mês atrás, eu saía para trabalhar, o pequeno estafermo ia para o liceu e sim levava comida, que a criança é chique e detesta a comida da cantina, então toca de pôr a mãe a fazer comida caseira (não sei como se safa nos acampamentos dos escuteiros, acho que qualquer massa com atum sabe a bife wellington), óbvio que cozinhava, mas confesso que não era atacada por desejos. Nestes tempos estranhos em que se confunde o pequeno escritório montado na sala, com as conference calls nas cozinhas, tendo como companhia os tachos, porque tenho um a ter video-conferencias, outro na tele escola, perco o olhar pelas prateleiras e rapidamente estou com um olho nos ingredientes e outro nos processos, muito me espanta como é que no meio de uma questão eu ainda não soltei um " ah porra são 4 ovos e 100 de açúcar", não percam fé minha gente, isto com tempo chega lá e aí sim será o meu fim...
Com o aproximar da Páscoa a coisa tende a ficar estranha, este ano não vamos a Espanha com os pagões, alcunha carinhosa dos meus amigos, não vamos ter o cabrito na mesa, o folar, o ninho de ovos, a mesa cheia de família à volta, este ano não vai haver via sacra nas ruas, mas antevejo uma via sacra dura em termos de dieta e colesterol aqui deste corpinho.
Vai dai, resolvi dar largas à imaginação e fazer uma Crumble de maçã, ficou em falta a bola de gelado de nata em tempos de covid, não se pode ter tudo, mas o sabor estava lá e caramba, quase que verti uma lágrima.
Não contente com isto, estava com uma vontade de comer favas, isto chega a primavera e as favas é já uma tradição, ficou a faltar a carne de porco mas todo sabor estava nas bichas, rjinhas como gosto, a farinheira era horrível, como digo o sabor estava lá e sem poder ir ao meu talho tive que me contentar com o que tinha à mão, aposto que a Milocas do meu coração onde quer que esteja esboçou um sorriso.
Ora, como podem ver é toda uma renuncia quaresmal que vai por agua abaixo em direcção ao rio Tejo mesmo aqui à porta, acho que isto nem indo de joelhos até Santiago Compostela me safa.... melhores dias virão e Deus, nosso senhor, vai ter de me fazer uma moratória.
Entretanto, a minha casa de banho também não ajuda, já não basta uma pessoa ter de atender o telefone na dita, tenho a minha a cheirar a croissant frescos várias horas por dia, nada como ter uma pastelaria com fabrico próprio mesmo à minha beira, é todo um exercício matinal a tentar adivinhar de é brioche ou francês, isto consome-me.
Não feliz com esta parafernália de gordices, aqui a vossa amiga resolveu dar tudo nos Petit Gateau do demónio, é realmente um doce que gosto muito, aquele piqueno bolo de chocolate, em que ao tocar suavemente se vai abrindo para nós, como se de um sorriso se tratasse e escorre aquele chocolate por cima do morango estrategicamente colocado no prato. Não, meus amores, não estou a descrever nenhuma cena de um filme erótico, se bem que a sensação de cada colher é basicamente orgásmica.
Como podem ver se isto não é património da UNESCO, então andam todos errados, todo este bolinho transborda elegância e charme. Juro que senti umas piquenas borboletas no meu estômago, quando estes meninos saíram do forno, assim tão lindinhos, prontos a serem comidos. Foram feitos de raiz, e foi a primeira vez que os fiz e como saíram tão bem, isto sim é dar tudo em ganhar uma ancas de luxo e recuperar as minhas bochechas, entretanto perdidas no meio de alguma limpeza diária.
Das duas uma, o filho da mãe do corona vai à vidinha dele, lá nos quintos dos infernos ou eu termino este isolamento pronta par abrir a"Chéz kiki, doces e afins"
Perante toda esta descrição de pandemónio em forma de gula, tranquei o próprio do pecado na dispensa numa quarentena, forçada que vai ter mais dias que a própria quaresma.
Ficam aqui pequenos laivos de pura parvoíce, embrulhado em queijo amanteigado com, presunto em lascas de Figos pingo de mel. Pelo prazer de escrever Pode acontecer "Conversas de um Cão" no intervalo, dos laivos de parvoíce, não em figos com queijo mas embrulhados em biscoitos e bacon
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quarta-feira, 1 de abril de 2020
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